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Margareth Dalcolmo é eleita Personalidade do Ano no Prêmio Faz Diferença 2020

Publicação: 10 de agosto de 2021

Pneumologista e cientista da Fiocruz se tornou uma voz de esclarecimento sobre a Covid-19, influenciou o tratamento para a doença, conduziu pesquisas e enfrentou pessoalmente o vírus

SÃO PAULO – Poucos cientistas vivenciaram a pandemia da Covid-19 com tanta intensidade quanto a médica pneumologista e pesquisadora da Fiocruz Margareth Maria Pretti Dalcolmo, de 66 anos, escolhida Personalidade 2020 pelo Prêmio Faz Diferença, representando também seus colegas brasileiros que se destacaram pelo combate ao negacionismo”. Colunista do GLOBO e coordenadora de estudos importantes na área, ela desenvolveu um entendimento da doença que influenciou a prática clínica no país, ao mesmo tempo em que se tornou uma voz de esclarecimento para a população, através da mídia.

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Quando o Sars-CoV-2 desembarcou no Brasil, Dalcolmo conta que não tinha noção do tamanho que seria o desafio de enfrentá-lo.

— Para nós, naquele momento, a Covid-19 parecia ser mais uma virose respiratória que iria aparecer e desaparecer, como foram outras coronaviroses anteriores, a SARS-1 e a MERS — conta. — O que deixou claro para nós que não iria ser assim foi a entrada da doença na Europa, no fim de janeiro, quando começaram a aparecer os casos na Itália, morrendo muita gente.

Dalcolmo já tinha participado de comitês de preparação para outras epidemias, como na gripe aviária, em 2004, e era cientista de renome em tuberculose. Por isso, foi chamada para compor o grupo de especialistas que daria suporte ao ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta. Trabalhou ali com Júlio Croda, então diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis, seu colega e amigo de longa data.

A cientista conta que as reuniões eram precedidas por uma rotina de contatos com colegas europeus e leitura de uma enxurrada de estudos novos para tentar antecipar como a epidemia se desenrolaria no Brasil. Nessa época, a médica já estava atendendo os primeiros casos de Covid-19 no Rio.

— Os primeiros pacientes que eu tratei tinham ido a desfiles de escola de samba, e logo ficou claro que a gente estava lidando com uma doença de grande capacidade de transmissão — conta. — Rapidamente, aprendemos que a Covid-19 era uma doença sistêmica, e vimos que alguns dos pacientes morreram no inicio da epidemia não só por pneumonia, mas por doença trombótica.

Dalcomo foi vacinada em janeiro, na sede da Fiocruz, em Manguinhos, Zona Norte do Rio Foto: Cléber Júnior / Agência O Globo
Dalcomo foi vacinada em janeiro, na sede da Fiocruz, em Manguinhos, Zona Norte do Rio Foto: Cléber Júnior / Agência O Globo

Vendo que o coronavírus era capaz de provocar dano neural e, sobretudo, nos vasos sanguíneos, Dalcolmo e outros colegas influenciaram a comunidade médica brasileira a mudar o protocolo de tratamento da doença, então muito focado em suporte respiratório. A nova abordagem era mais atenta para danos em outros sistemas vitais dos pacientes, e introduziu o uso de corticoides para conter problemas vasculares.

Com a demissão do ministro Mandetta, o grupo de cientistas se viu impedido de aconselhar a nova gestão da pasta. Dalcolmo buscou contribuir para políticas públicas na resposta à pandemia então no Estado do Rio.

Diálogo interrompido

Um grupo de especialistas que incluía o ex-ministro José Gomes Temporão fora recrutado a pedido do ex-governador Wilson Witzel para desenhar a política fluminense contra a Covid-19. À época, ainda não era conhecido do público o esquema de corrupção na Saúde que levaria Witzel ao impeachment.

— Entregamos nosso relatório no fim de abril, dizendo que o pico epidêmico ainda viria, e recomendamos ao então governador a instituição de um lockdown, mas ele nem chegou a nos receber — conta. — Depois, seu secretário (Edmar Santos, que ocupou a pasta da Saúde) apareceu naqueles escândalos todos, e eu e Temporão pedimos a dissolução do grupo, porque não fazia mais sentido.

Com os cientistas afastados das decisões governamentais, Dalcolmo intensificou uma atividade que já vinha fazendo em paralelo: conceder entrevistas.

Na ausência de uma campanha federal para educação pública sobre Covid-19, a médica viu na colaboração com jornalistas a oportunidade para fazer o público entender a importância de medidas como o distanciamento social, o uso de máscaras e a busca pela vacina.

Em abril de 2020, passou a integrar a equipe de colunistas do GLOBO. Seu texto transparece afinidade com a literatura, sua segunda paixão depois da medicina. (O amigo Croda conta que seu sonho de juventude era se tornar embaixadora, o que a levou a estudar línguas.)

A divulgação científica lhe rendeu novas amizades, como a colega de coluna Natália Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência.

— Foi o trabalho em defesa da ciência e da medicina baseada em evidências que nos uniu. Poucas pessoas fizeram tanta diferença para gerar credibilidade para a ciência quanto Margareth — conta a microbiologista.

O neurocientista Roberto Lent, professor da UFRJ, seu outro colega de coluna no GLOBO, acrescenta:

— Ela administra qualidades diferentes para lá de necessárias neste momento de crise aguda na saúde, na educação, na economia e na moralidade pública no Brasil.

Apesar da rotina de pesquisa e clínica, Dalcolmo só deixou de colaborar com os jornalistas em alguns dias de maio, quando ela própria adoeceu de Covid-19.

— Aquele era um momento em que morria muita gente com o vírus, e eu tomei providencias práticas. Escrevi todos os meus desejos e fiz uma procuração para uma irmã explicando tudo o que eu queria que fosse feito caso eu tivesse que ser intubada e ir para um CTI — conta.

Duelo com o vírus

Apesar de sair do hospital em pouco tempo e sem pneumonia, permaneceu fraca e indisposta por 17 dias.

— Fui embora de casa para preservar meu marido que não tinha se contaminado. Fiquei num apartamento sozinha, eu e Deus, e tinha alguém para me entregar comida na porta — relata.

Após testar negativo, voltou às entrevistas e à rotina clínica de atender de oito a dez pacientes por dia. Como tinha sido contaminada antes, não pôde participar como voluntária dos testes da vacina no segundo semestre de 2020, e só veio a receber o imunizante em janeiro deste ano. A Fiocruz lhe concedeu a honra de ser a primeira profissional de saúde a receber a vacina de Oxford.

Hoje, junto com Croda, que deixou o ministério, a pesquisadora conduz os últimos estágios da pesquisa que avalia a influência da vacina BCG na imunidade de Covid-19. O infectologista também é seu parceiro no estudo clínico de fase 3 do antiviral molnupiravir.

— Durante toda a pandemia, Margareth foi incansável — conta Croda. — O trabalho dela de traduzir o que a ciência recomenda para o combate à pandemia foi importantíssimo num momento difícil que vivemos, com um vácuo deixado pelo Ministério da Saúde, que não se comunica adequadamente com a população.

De maneira figurada, o sonho de infância de se tornar diplomata acabou se realizando.

— Margareth é a embaixadora da ciência no Brasil — diz o infectologista Marcus Lacerda, da Fiocruz Amazonas. — Ela suaviza temas polêmicos e é dura na hora de enfrentar a desinformação, sempre com diplomacia e solidez. Consegue falar sobre a incerteza com certeza. Foi um bálsamo durante um período tão sofrido.

Jurados

Alan Gripp (diretor de Redação do GLOBO); Ancelmo Gois, Lauro Jardim, Merval Pereira, Míriam Leitão (colunistas); e Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira (presidente da Firjan).

Fonte: https://oglobo.globo.com/premio-faz-diferenca/margareth-dalcolmo-eleita-personalidade-do-ano-no-premio-faz-diferenca-2020-25134731?fbclid=IwAR04vcraqfQFzGAkUyJ9muyS34CssEQWlQR6mgZf7mAiN-abEPtXI7S32rE

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