Últimas Notícias

Novo livro acompanha práticas do cuidado em saúde no tratamento da tuberculose

Marcella Vieira/Editora Fiocruz

Fortalecer e destacar as práticas de profissionais e agentes de saúde pública em todos os territórios do país. Uma das missões da Fiocruz que se tornou ainda mais urgente e necessária desde o início da pandemia de Covid-19. É nesse contexto que a Editora Fiocruz faz seu último lançamento de 2021: Vidas em Exclusão e a Reinvenção do Cuidado. Escrito por Roberta Gondim de Oliveira, o livro estará disponível para aquisição a partir de 15 de dezembro, nos formatos impresso – via Livraria Virtual da Editora – e digital, por meio da plataforma SciELO Livros.

Com base em ampla pesquisa desenvolvida durante o doutorado da autora, o título narra um estudo empírico em dois territórios da cidade do Rio de Janeiro: Rocinha e Manguinhos. Nesses lugares, Gondim, que é pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), acompanhou as práticas de profissionais de saúde pública voltadas para o tratamento da tuberculose.

Ao acompanhar as equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF) e do dispositivo Consultório na Rua (CnaR) por becos, vielas, viadutos e afins, ela desvela desafios para o enfrentamento da doença, que é diretamente associada a condições sociais precárias. “Reconhecer a tuberculose como doença negligenciada revela desdobramentos de um conjunto ampliado de negligências – de corpos, sujeitos e territórios, na problematização de formas de produção de conhecimentos e práticas que atuam sobre estes. Essa perspectiva analítica delineia o desafio que se pretende aqui enfrentar”, diz a autora.  

Roberta Gondim ressalta que, em espaços conhecidos por cenas de uso de crack e outras drogas e demais situações de ampla vulnerabilidade econômico-social, ela pôde vivenciar – em diversos encontros – uma miríade de situações de cura da tuberculose, de abandonos e de retorno ao tratamento, de internações, de cuidado com o corpo, da busca da beleza, de festas, de desejos de vida, mas também de muitas mortes. Assim, ela deixa claro que o livro fala sobre cuidado e saúde, mas também fala, principalmente, sobre pessoas que têm nome, história, projetos de futuro e desejos de vida. 

Em quatro capítulos, a obra parte de perguntas potentes, que são levantadas e debatidas pela pesquisadora. De que forma o cuidado em saúde se faz? Como as referências de atenção à saúde que se aprende são postas em ação nesses contextos, tendo como cenário essa trama social que inviabiliza cotidianamente a vida de determinadas pessoas?

No primeiro capítulo, Gondim reflete sobre a chamada “produção de vidas precárias”, refletindo sobre colonialidade e saúde. “Uma discussão sobre a feitura de vidas precarizadas nos marcos do colonialismo, que produz uma cisão de mundo fundante do Norte e Sul global, na qual corpos e territórios são constituídos em assimetria de humanidade e de direitos”, resume.

Na sequência, nos capítulos 2 e 3, o título aborda exclusão e cuidado e também práticas de saúde nas ruas. “Trago discussões que são fruto de uma imersão etnográfica em caminhos e práticas de atenção à saúde voltadas para a tuberculose, em que vidas precarizadas por esse enredo se desenrolam”, destaca. São narrações e reflexões sobre encontros e eventos do trabalho em saúde ocorridos em torno da doença, em espaços territoriais urbanos precarizados da cidade, incluindo o entorno da Avenida Brasil, onde a região de Manguinhos está situada.

Um trecho que compõe o título do segundo capítulo é aqui a tuberculose é assunto todos os dias, frase que a autora diz ter escutado muitas vezes durante o trabalho na Rocinha. Gondim destaca também a parte Susana varre a calçada da cracolândia: práticas de saúde nas ruas – que dá nome ao terceiro capítulo. “O cotidiano do processo de trabalho e dos encontros entre profissionais da saúde e as pessoas em situação de rua conformavam uma plasticidade do cuidado numa agenda transformadora nas relações concretas. Isso é algo que, muitas vezes, não se aprende nos bancos das formações profissionais”, analisa. 

Ainda no terceiro capítulo, o cuidado em saúde sobre pessoas e territórios vulnerabilizados é o ponto de partida, discutindo questões fundamentais como: diagnósticos, tratamentos, fome, valas, remédios, drogas, prontuários, viver nas ruas, fugir da polícia, amar, curar e morte. “Todos são elementos presentes em redes de feituras de vida e de saúde”, afirma Gondim. 

O último capítulo dedica-se a problematizar os enredos de produção de desigualdades e subalternidades vivenciadas em ambos os territórios. “Proponho uma leitura sobre a geopolítica colonial de doenças, sua desigual distribuição, bem como sua conformação e arranjos políticos, tendo como recorte as doenças negligenciadas, em especial a tuberculose – seus contornos e inscrições nas arenas global, nacional e local”, finaliza a autora, na apresentação dos capítulos que compõem o livro. 

A saúde como um dos múltiplos elementos do fenômeno ‘estar na rua’
Um dos dispositivos de assistência social e saúde pública de destaque no livro é o CnaR, que, em 2011, foi instituído como política nacional. As ações do Consultório na Rua ocorrem de maneira descentralizada nos serviços de saúde dos milhares de municípios brasileiros.

Médica de Saúde e Comunidade dedicada ao dispositivo, Valeska Antunes destaca, no texto de quarta capa, o trabalho e o olhar sensível da autora. “A devolutiva de suas análises me convida, como trabalhadora da saúde, a refletir sobre os sentidos, limites, potencialidades e impactos do cuidado nos serviços públicos de saúde na realidade brasileira e, de certa forma, nos presenteia ao dar visibilidade ao esforço de tantos profissionais que buscam cotidianamente reinventar suas práticas ao se depararem com as consequências da desigualdade social racializada que nos assola, e não se rendem ao cinismo da necropolítica”, exalta Antunes.

Para Roberta Gondim, propor a atenção à saúde da população em situação de rua deve prever o enfrentamento de contradições e situações complexas que não são resumidas e sensíveis apenas às ações pontuais de assistência em saúde. “Reitero que o estar na rua é fenômeno político, econômico e social, perspectivando uma miríade de vulnerabilidades que implicam um agenciamento de múltiplas naturezas, e a saúde é mais um dentre outros elementos”, destaca.

Sobre a autora
Psicóloga formada pela Universidade Federal do Pará (UFPA), Roberta Gondim de Oliveira é mestre em Saúde Pública pela Fiocruz e tem doutorado na área de Sociologia do Programa de Governação, Conhecimento e Inovação do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (Portugal). É professora e pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz). 

Fonte: https://portal.fiocruz.br/noticia/novo-livro-acompanha-praticas-do-cuidado-em-saude-no-tratamento-da-tuberculose