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Projeto leva acesso à profilaxia para jovens em Cidade Tiradentes

Publicação: 3 de março de 2021

O uso do medicamento diariamente pode evitar a incidência do vírus do HIV. Estudo instalado em ocupação conta com ‘robô’ que responde dúvidas e trabalho de campo de equipe multidisciplinar

Desde novembro de 2020, o espaço do coletivo OSIP (Organização Social Identidade Periférica), em Cidade Tiradentes, zona leste de São Paulo, acolhe o projeto PrEP15-19. O objetivo é apresentar o uso da PrEP (Profilaxia pré-exposição) ao HIV e levar o tratamento para além da região central da capital.

“O foco são homens gays, mulheres trans e travestis moradores do entorno”, explica Paula Massa, 39, psicóloga e coordenadora da pesquisa de campo do projeto PrEP1519, em Cidade Tiradentes.

Com atuação direcionada a adolescentes de 15 a 19 anos que se identificam como homens gays, mulheres trans e travestis, a iniciativa busca reduzir a incidência de HIV neste grupo e medir a aceitação do tratamento com a PrEp e o autoteste para HIV.

“O vírus é igual para todos, mas a incidência é maior em algumas populações. O preconceito também impede que esses indivíduos busquem atendimento e consigam ser acolhidos no sistema”, explica Massa sobre o porquê da escolha do público-alvo.

Uma pesquisa encomendada pelo Ministério da Saúde, divulgada na revista científica Medicine, mostra que os casos de HIV e Aids triplicaram nos jovens na faixa de 15 a 19 anos no Brasil entre o período de 2006 a 2015.

“Diferentemente da região central onde há uma concentração do público LGBT e já conhecem o tratamento da profilaxia, aqui [Cidade Tiradentes] os jovens chegam sem conhecimento sobre esse tratamento”, explica Wellington Matos, 34, presidente da OSIP (coletivo que acolheu o projeto) e morador do bairro.1 / 5Imagem da galeria

PROFILAXIA PARA NOVOS GRUPOS

O projeto PrEP1519 teve início na região central da capital, em meados de 2019, mas foi justamente um mapeamento de público que fez a iniciativa chegar ao bairro, já que muitos vinham da zona leste. 

“A gente fez uma pesquisa qualitativa para identificar em que ponto da região teria o maior alcance dos jovens e maior pessoas com indicação para uso da Prep, e descobrimos que era em Cidade Tiradentes”, explica Paula Massa.

Dos mais de 8.000 usuários de profilaxia atualmente em São Paulo, 83,6% são gays/homens que fazem sexo com outros homens (HSh cis). Mais da metade (64,56%) também é autodeclarada de cor de pele branca ou amarela. O levantamento foi feito pela reportagem no Painel Prep do Ministério da Saúde.

“Ter acesso à profilaxia em Cidade Tiradentes nos coloca em posição de igualdade com os moradores da região central. A maior parte do público que tem acesso a esse programa são brancos de poder aquisitivo mais alto e maior nível de instrução”, aponta Paula, coordenadora da pesquisa de campo na região.

Para o sociólogo Alexandre Grangeiro, pesquisador do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP e pesquisador principal do projeto em São Paulo, o principal desafio é vencer o isolamento desses grupos, o que facilita a circulação do HIV.

“O estigma desses grupos faz com que se evite a procura de serviços e aumenta o receio de um diagnóstico, acrescendo o tempo que uma pessoa infectada pode transmitir o vírus involuntariamente”, diz Granjeiro. “A oferta de serviço direta na comunidade tem potencial para quebrar esse ciclo.”

“No caso de pessoas trans, há ainda o maior empobrecimento e exclusão, desde cedo, de todas as instituições, começando pela escola. Essas desvantagens aumentam ainda mais a vulnerabilidade para qualquer doença, incluindo o HIV”, completa.Equipe do projeto que tem pesquisado o uso da profilaxia em Cidade TiradentesArquivo Pessoal

Para Yago Vitorino, 22, que faz uso da Prep, agente de prevenção e educador na ação, a profilaxia foi o que lhe tirou o medo e permitiu iniciar a vida sexual sem paranóias.

“Fui muito hipocondriaco, por conta do medo que meus pais me colocaram sobre IST’s (infecções sexualmente transmissíveis), em destaque o HIV. Sempre que fazia sexo era uma paranoia diferente. Passei a tomar Prep, e a minha vida mudou. Aquele medo passou a ser menos alarmante e paranoico”, comenta.

Vitorino lembra que o diagnóstico de HIV não é o fim do mundo, mas pode ser especialmente mais difícil para os mais jovens.  “Não aguento mais ver meninos de 16 anos tendo seu chão tirado porque o diagnóstico deu positivo. A prep se faz necessária para diminuir casos assim”, comenta.

O agente de prevenção mora em Itaquera, bairro também da zona leste, e enxerga que a periferia está longe do debate e do acesso à Prep. 

“A profilaxia é de extrema importância para a periferia. O preservativo vem caindo no esquecimento coletivo. Tenho percebido muita relutância com as pessoas sobre o assunto da Prep. Todos alegam usar camisinha e que não precisam”, comenta.

“Desconfiam do nosso projeto. Por dia, preciso explicar para pelo menos 15 jovens a mesma informação.” Para Yago, a distância também pode ser um indicativo do risco maior que esses jovens correm. 

“Fica escancarado que a informação não está chegando para jovens da periferia, a maioria de negros, que estão sucesstíveis a contrair alguma IST, já que não estão sendo ensinados a se cuidarem”, explica.

SAÚDE, RESISTÊNCIA E INOVAÇÃO

A abordagem do programa, além do público-alvo, com faixa etária diferenciada também é um dos grandes trunfos do projeto.  A equipe de campo visita áreas mais propensas a encontrar os potenciais usuários do método preventivo e tem profissionais que se identificam com os possíveis pacientes.

“Literalmente os pesquisadores estão buscando fluxos, baladinhas e locais onde existe encontro dos jovens com o perfil da pesquisa. Por isso, além da equipe de profissionais da saúde, há os educadores que também são jovens gays que fazem o primeiro contato”, afirma Wellington Matos, presidente do coletivo que cedeu espaço para o projeto.

Pensando em quem se sente inibido a procurar ajuda ou informações presencialmente, ou até pelo momento de pandemia de Covid-19, em que as saídas às ruas diminuíram, o projeto também conta com a ajuda da ‘robô’ Amanda Selfie.

Trata-se de um perfil criado nas redes sociais, Instagram e Facebook, que responde automaticamente dúvidas sobre profilaxia, autotestagem para HIV e outras questões relacionadas a infecções sexualmente transmissíveis.

Além de São Paulo, o projeto PrEP1519 também está em Salvador e Belo Horizonte. No total, são 871 participantes. Na capital paulista, dos 406 usuários, 317 já estão fazendo uso da profilaxia.

Fonte: https://www.agenciamural.org.br/profilaxia-jovens-cidade-tiradentes/?fbclid=IwAR0aHaXLw_BwF6SYX-CX2oDuEBEmxURlMpg2DhUpv299caguf0fI-6YdVJs

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